Fonte: Novembro Azul – Diário de S.Paulo 01/11/2015
Em um bate-papo de bar o assunto é piada. Para a maioria dos homens, um tabu, capaz de ferir a masculinidade. A realidade é que o “temido” toque retal é rápido, indolor e a única garantia de um diagnóstico precoce do câncer mais comum entre os homens. Se descoberto em fase inicial, as chances de cura são de 90%.
É para alertar sobre o câncer de próstata que o Novembro Azul, campanha de conscientização sobre a saúde do homem, começa neste domingo (1º). O principal intuito é conscientizar quem tem a partir de 50 anos a fazer o exame de toque retal anualmente. Para quem tem histórico da doença na família, a instrução é começar aos 45 anos.
“Temos de falar com exaustão do assunto porque ainda há muito preconceito em volta dele. Hoje, metade dos homens na idade não fazem o exame e parte dos que procuram um urologista só vai porque é incentivado pelas mulheres”, disse o urologista do IBCC (Instituto Brasileiro de Controle do Câncer) e do Hospital da Aeronáutica, Dr Alvaro Bosco.
Silenciosa, a doença pode levar nove anos para o surgimento dos primeiros sintomas. Por isso, a análise da próstata permite ao urologista identificar se há alguma alteração no tamanho e textura. Ela e o teste de PSA (exame de sangue que identifica variação na próstata) são os únicos meio de descobrir anormalidades na glândula, responsável pela produção de parte do sêmen, que protege o espermatozoide.
“É muito comum o paciente chegar ao urologista já com o PSA alterado. Isso ocorre porque, sabendo da falta de hábito de procurar um urologista, o cardiologista ou clínico pedem o teste de PSA durante um check-up ”, explicou Bosco.
A oncologista do HCor (Hospital do Coração), Lucíola de Barros Pontes, no entanto, alerta que o exame faz uma análise parcial. “Ele só identifica o câncer em 30% dos casos. A biópsia é o que determina o câncer e seu estágio”, alertou.
Idoso identificou doença no início e pôde ser salvo
Foi graças ao hábito de fazer o exame de toque retal anualmente que o corretor de imóveis, José Eduardo Laperza, de 69 anos, teve o diagnóstico de câncer de próstata logo no início da doença.
Identificar no começo garantiu ao idoso se livrar do problema quatorze meses depois de receber a notícia do médico. “Em agosto do ano passado, eu retirei a próstata e hoje não tomo mais nenhum medicamento. Levo uma vida saudável. Eu sinto como se não tivesse tido esse câncer”, comemorou José.
Antes de enfrentar o tratamento, o idoso já enfrentava outro problema com a glândula, o HPB (Hiperplasia Prostática Benigna, leia mais na página 5). Mesmo não tendo qualquer relação com o câncer, José Eduardo fez por duas vezes a biópsia com receio de ter a enfermidade. “Em todas as vezes não apareceu nada, mas neste ano foi verificada uma alteração”, contou o idoso.
No mesmo período do diagnóstico de José Eduardo, um de seus amigos próximos também ficou sabendo que estava com o câncer, mas em estágio de metástase – quando o tumor já se espalhou para outros órgãos e ossos. “Ele não sobreviveu. Perdi o meu amigo”, lamentou.
É por ser uma doença de evolução lenta que o acompanhamento com o urologista precisa ser constante. De acordo com o médico da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), Alex Meller, alguns casos só exigem o acompanhamento médico, excluindo a necessidade de cirurgia, radioterapia e quimioterapia. “Depende da idade do paciente e o estágio da doença. Se for logo no início e ele já tiver uma idade avançada, não é preciso uma intervenção cirúrgica. O médico apenas acompanha”, explicou Meller.
Análise
Alvaro Bosco, do IBCC (Instituto Brasileiro de Controle do Câncer)
‘Impotência aumenta com idade’
A impotência sexual é um grande medo dos homens que vão ser submetidos ao tratamento de câncer de próstata. Existe uma mística em torno desse tema. No entanto, a gente observa que a maioria de quem tem uma potência boa antes do tratamento e quando o tumor não é muito grande, normalmente continua com uma vida sexual ativa. As chances de ele ter uma impotência são menores. Já o idoso que não tem uma potência boa antes da cirurgia, ele tende a ter um problema no pós-operatório. A radioterapia também possibilita que esse homem fique impotente, mas há inúmeros tratamentos para resolver esse problema
Entrevista com Lucíola de Barros Pontes_ oncologista do HCor
‘Obesidade está relacionada ao aparecimento do câncer’
DIÁRIO_ O Inca (Instituto Nacional do Câncer) estima que, apenas neste ano, 70 mil novos casos de câncer de próstata vão surgir. É possível precisar quantos desses pacientes não vão sobreviver?
LUCÍOLA PONTES_ Não é possível dar exatidão disso porque as chances de sobrevivência dependem do estágio em que é diagnosticada. Seria fundamental que todos esses 70 mil viessem com a doença no início para garantir uma cura de nove em cada dez pessoas. Mas, infelizmente, uma parte dela vai buscar ajuda na fase metástatica, quando os sintomas já começaram a se manifestar.
Em todos os casos será necessário retirar a próstata ou o tratamento pode se limitar a radioterapia e quimioterapia?
Diferente da mama que pode retirar apenas uma parte, quando há a indicação para fazer a cirurgia é feito a prostatectomia, ou seja, a retirada integral da glândula. Outra diferença é que no câncer de mama ocorre a retirada do nódulo e também há a necessidade de fazer a quimioterapia e a radioterapia. No câncer de próstata, não. É feita a cirurgia ou o tratamento com medicamentos.
É possível prevenir o surgimento do câncer de próstata ou dos fatores de risco?
O principal fator de risco é a idade. Se tem mais de 50 anos, precisa fazer o exame anualmente, mas também é importante ficar alerta à hereditariedade e dobrar os cuidados se já houve casos na família. Hoje vários estudos relacionam a obesidade ao surgimento de células cancerígenas. Por isso, é fundamental praticar atividades físicas regularmente.
Crescimento da glândula ocorre a partir dos 40
HPB faz a próstata aumentar em até dez vezes o seu tamanho e, com isso, comprime a bexiga, obrigando o homem a ir muitas vezes ao banheiro
Comum a partir dos 40 anos, a HPB (Hiperplasia Prostática Benigna) provoca o aumento da próstata e, consequentemente, na compressão da bexiga. Sem qualquer tipo de relação com o câncer, não traz risco à vida do paciente, mas é extremamente desconfortável por levar o doente várias vezes ao banheiro, sobretudo à noite.
A glândula normal tem o tamanho de uma noz, mas com o crescimento desordenado, ela pode aumentar o seu tamanho em até dez vezes, segundo especialistas. “É natural a próstata começar a aumentar a partir dos 40 anos, mas em alguns homens esse crescimento é mais rápido e precisa de intervenção médica”, explicou o urologista do IBCC (Instituto Brasileiro de Controle do Câncer) e do Hospital da Aeronáutica, Alvaro Bosco.
De acordo com o médico, é a partir dos 60 anos que o tratamento clínico para o HPB é mais comum. Nessa faixa etária, um quarto dos homens desenvolve a doença benigna.
“Todos os homens que viverem mais de 80 anos vão ter de tratar a hiperplasia da próstata. Faz parte do envelhecimento. É como a perda de cabelo ou a diminuição da visão. Vai acontecer com a grande maioria dos homens”, disse o coordenador do Hospital do Homem, ligado à Secretaria Estadual de Saúde, Joaquim Claro.
A hiperplasia, no entanto, não tem qualquer relação com o surgimento do câncer. “O meu caso foi uma excepcionalidade. Não existe ligação entre os dois problemas com a glândula, mas aconteceu comigo”, disse o corretor de imóveis José Eduardo Laperza, 69.
A solução para o problema também é mais simples. Geralmente não é preciso fazer cirurgia, apenas um tratamento a laser. O paciente recebe alta em poucos dias.
Por: Lucilene Oliveira